Blog do Dr. Lucas
Sintomas de diabetes

Com o crescimento progressivo da prevalência do diabetes mellitus na população, é natural que as pessoas tenham receio de desenvolver a doença e suas graves complicações e, por esse motivo, estejam atentas para qualquer alteração no seu organismo que possa estar relacionada a essa patologia. Assim, uma pergunta que tem se tornado cada vez mais comum no consultório do endocrinologista é: quais são os sintomas de diabetes?
O diabetes mellitus é uma doença silenciosa
O primeiro conceito importante sobre o quadro clínico do diabetes é que essa doença é, na maioria dos casos e por um longo tempo, assintomática. Isso significa que uma pessoa portadora de diabetes pode passar meses a anos sem apresentar qualquer sintoma – inclusive, em alguns casos, a primeira manifestação pode ser já alguma complicação da doença, como perda visual, feridas nos pés, alteração dos rins, doença cardíaca ou cerebral.
Esse contexto explica a necessidade de que toda pessoa portadora de fatores de risco para diabetes passe por avaliação e rastreio da doença, a fim de que tenha um diagnóstico precoce e tratamento adequado.
Então o diabetes não provoca sintomas característicos?
Calma, não é bem assim.
O termo diabetes mellitus se refere a um grupo de doenças que têm como característica em comum a hiperglicemia, ou seja, a glicose aumentada no sangue. O tratamento do diabetes, por sua vez, tem como objetivo justamente a redução da glicemia, o que traz o risco de uma complicação chamada hipoglicemia – ou seja, quando a glicose está muito baixa no sangue. A hiperglicemia e a hipoglicemia são os responsáveis pelos sintomas de diabetes, como veremos a seguir.
Sintomas de diabetes causados pela glicemia elevada
De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD), os sintomas da hiperglicemia estão presentes em aproximadamente 20-30% das pessoas com a doença.
Em qualquer pessoa (com ou sem diabetes), a glicose do sangue é filtrada pelos rins e uma parte dela é reabsorvida logo em seguida. No caso do portador de diabetes, quando a glicemia está muito alta (geralmente em níveis maiores que 180mg/dL), ocorre um estado de hiperfiltração nos rins, que acabam não conseguindo reabsorver toda a glicose filtrada. Esse açúcar em grande quantidade vai puxar muita água para a urina, originando o primeiro sintoma de diabetes – a poliúria, ou seja, o aumento do volume urinário. É comum, inclusive, que a pessoa se queixe de acordar muitas vezes à noite para urinar – é o que chamamos de noctúria.
Essa micção excessiva, por sua vez, provoca perda de grande quantidade de água do nosso corpo, o que leva à ativação do maior protetor contra desidratação no nosso organismo: o mecanismo da sede. Assim, o segundo sintoma de diabetes é a polidipsia – a sede excessiva.
A hiperglicemia tem um terceiro efeito muito importante no nosso metabolismo: o atordoamento do pâncreas. Veja, a glicose em níveis elevados é tóxica para o pâncreas, que é justamente o órgão produtor de insulina. A insulina, por sua vez, tem o papel de tirar a glicose do sangue e colocar dentro das nossas células, para que seja usada como fonte de energia. Quando a glicemia está muito alta, o pâncreas sofre toxicidade e reduz sua capacidade de produzir insulina – com isso, nossas células não recebem a glicose e, portanto, não conseguem produzir energia. Surge então o próximo sintoma: a polifagia, ou seja, o aumento da fome.
Em paralelo, nosso organismo começa a buscar fontes alternativas de energia para sobreviver – para isso, começa a usar proteínas dos músculos e gordura. Surge, então, mais um sintoma: a perda de peso.
Por fim, outra alteração comum decorrente da glicemia muito alta é a visão turva, e o mecanismo é simples: a glicose alta do sangue extravasa para dentro dos olhos e dificulta a passagem da luz – é como se, dentro dos globos oculares, houvesse uma água misturada com açúcar, ao invés de uma água transparente.
Em resumo, os sintomas de diabetes causados pela hiperglicemia são:
- Poliúria e noctúria
- Polidipsia
- Polifagia
- Perda de peso
- Visão turva
Sintomas de diabetes causados pela glicemia baixa
A hipoglicemia é a complicação aguda mais comum do tratamento do diabetes mellitus, e é definida como a glicemia menor do que 55mg/dL. Seus sintomas são resultantes da falta repentina de glicose para nossas células – principalmente no cérebro e no sistema cardiovascular. Assim, podemos dividir os sintomas da hipoglicemia em dois grupos:
- Sintomas neuroglicopênicos – resultantes da falta de glicose no cérebro:
- Tontura
- Fraqueza
- Sonolência
- Confusão mental
- Convulsões
- Coma
- Sintomas adrenérgicos – decorrentes da liberação de adrenalina pelo sistema cardiovascular:
- Tremores e palpitações
- Ansiedade e agitação
- Sudorese
- Fome
- Formigamentos
É importante destacar que o diabetes, por si só, não provoca hipoglicemia – esse evento é resultante das medicações utilizadas para tratamento da doença.
As crises hiperglicêmicas
Anteriormente, discutimos os sintomas de diabetes provocados pela hiperglicemia e seus mecanismos. Esses sintomas têm, habitualmente, baixa gravidade e não trazem risco imediato à vida.
No entanto, em situações especiais, a glicemia elevada pode trazer complicações agudas extremamente graves que podem levar rapidamente ao óbito. São as chamadas crises hiperglicêmicas: a Cetoacidose Diabética e o Coma Hiperglicêmico Hiperosmolar.
Cetoacidose diabética (CAD)
Já vimos que a insulina tem o papel fundamental de tirar a glicose do sangue e colocá-la dentro das células. No entanto, é importante conhecermos outra ação crucial desse hormônio: impedir que moléculas de gordura sejam quebradas e usadas como fonte de energia.
Veja bem: a fonte de energia primária do nosso organismo é a glicose. Quando a glicose no sangue aumenta, a insulina é liberada pelo pâncreas para fazer com que esse açúcar seja levado às células e usado como fonte de energia. Para que esse sistema funcione adequamente, é importante que não haja competição para a glicose – e é por isso que a insulina não deixa a gordura ser utilizada como fonte energética.
A maioria das pessoas portadoras de diabetes ainda tem uma reserva pancreática, ou seja, seu pâncreas ainda consegue produzir uma quantidade razoável de insulina. O problema ocorre, então, naquelas pessoas que já perderam toda a reserva pancreática – o que é comum nos portadores de diabetes tipo 1. Nessas pessoas, caso a reposição de insulina não seja feita adequadamente, as moléculas de gordura passam a ser constantemente quebradas, levando à produção dos chamados cetoácidos, substâncias tóxicas que provocam alterações respiratórias, neurológicas e cardiovasculares que podem levar à morte em poucas horas.
Dessa forma, entendemos que a cetoacidose diabética é uma crise hiperglicêmica que ocorre em consequência da deficiência completa de insulina e, por esse motivo, seu tratamento exige a pronta reposição desse hormônio.
Coma hiperosmolar hiperglicêmico (CHH)
Calma, não se assuste com o nome – o processo aqui é bem simples.
Como vimos anteriormente, a glicose em excesso no sangue acaba sendo hiperfiltrada pelos rins, levando à eliminação de muita água, com risco de desidratação. Esse efeito é evitado pelo mecanismo da sede – ou seja, tomar água. No entanto, pessoas que têm o mecanismo da sede prejudicado (como os idosos) ou que não têm livre acesso à água (como pessoas que dependem dos cuidados de outros, por exemplo, por doenças neurológicas ou limitação de mobilidade) podem sofrer desidratação progressiva, a qual pode se tornar grave a ponto de gerar alterações neurológicas como perda de consciência e coma.
Assim, o Coma Hiperglicêmico Hiperosmolar é uma crise hiperglicêmica que ocorre pela desidratação progressiva em pessoas sem acesso à água e, consequentemente, seu tratamento envolve a hidratação vigorosa e o controle da glicemia.
Conclusão
Vimos que os sintomas de diabetes estão ausentes na maioria dos seus portadores. Por outro lado, quando presentes, são mais frequentemente resultantes da hiperglicemia e, menos comumente, da hipoglicemia (que é consequência do tratamento, e não da doença em si). Por fim, é importante destacar os graves riscos associados às crises hiperglicêmicas, cuja identificação e tratamento precoces tem o potencial de salvar vidas.

Dr. Lucas Kloeckner de Andrade
Endocrinologista e Metabologista
CRM 33518 | RQE 29661